“O SÃO PAULO”, ano 58 de 12 a 18 de março de 2013 (semanário da Arquidiocese de São Paulo)
Foi o chamado movimento da Contra Reforma na Europa que suscitou a necessidade premente de se buscar um instrumento que distinguisse e controlasse cada um dos membros da Igreja Católica.
O tema era urgente e foi levado ao Concilio de Trento (1545-1563), longamente debatido, chegou-se à resolução do decreto que o Vigário passaria a ser responsável pelo registro de cada Batismo e de cada Matrimonio celebrado em sua Paroquia. A fórmula do registro foi minuciosamente estabelecida. Era preciso guardar o caráter universal e igualitário para os registros de cada católico.
Passado o Concilio, a Igreja logo se deu conta que era precisa registrar igualmente os óbitos de seus fiéis, para evitar abusos de toda sorte, como o da bigamia, quando um dos esposos migrava para regiões distantes e lá passando por solteiro, casava-se novamente. O Papa Paulo V, em 1614, através do Rituale Romanum estende a obrigatoriedade do registro aos óbitos, alem de impor o Liber Status Animarum, uma espécie de censo nominativo periódico dos paroquianos acima de 7 anos e por família. Cada vigário passava a ser o responsável pela redação de cada ato e pela sua guarda e conservação, em arquivo da Paroquia.
A riqueza das informações contidas nessa documentação serial é inestimável para o resgate da Historia social e cultural das populações católicas do passado e em varias direções. Pobres e ricos, plebeus e nobres, brancos, negros, índios, homens e mulheres, crianças e idosos, todos sem exceção, quando batizados, casados ou falecidos tinham seus dados registrados em livros especiais que deveriam ser conservados pela Igreja.
Sendo como foi, a religião católica a oficial em todo o Brasil Colônia e em todo o Império todos os que aqui nascessem, morressem ou casassem, deveriam passar pelo registro da Paroquia o que confere então à essa documento serial e nominativo um caráter universal.
Essas características únicas fizeram dos Registros Paroquiais fontes de primeira linha para se chegar às populações e às sociedades e suas culturas do passado.
Através de analises especiais criadas na França para tirar o melhor proveito dessa preciosa documentação surgia a ciência Demografia Histórica. Por esta se começou a conhecer não apenas os fenômenos demográficos antigos, mas ainda realidades humanas do passado nunca pensadas. O mundo da infância, da mulher, das doenças, das diferenças ante a morte, das epidemias, da família, do concubinato, do cotidiano e outros mais puderam ser melhor conhecidos. São muitas hoje as obras e artigos que mostram o cotidiano, as camadas populares e por segmentos, as diferenças raciais, sociais, econômicas e tantas outras fundadas nos registros paroquiais da catolicidade.
Daí a importância da Igreja preservar e corretamente os registros paroquiais que cobrem toda a Historia do Brasil.
Maria Luiza Marcilio é Professora Titular da USP, ex-presidente da Comissão de Direitos Humanos da USP e presidente do Instituto Jacques Maritain do Brasil
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