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SPAM: A INTERNET SEM ÉTICA

02 nov 2013

Por Lafayette Pozzoli
(com Marcos Luiz Mucheroni)

Somos obrigados, sob pena de não sermos considerados pessoas plugadas, urbanas e modernas, a presenciar nas ruas, rádios, TVs, celulares e e-mails todo o tipo de lixo pessoal e cultural. Os mais comuns são: como emagrecer em uma semana, como ficar rico sem sair de casa. Isto sem falar na propaganda de baixo nível e de toda espécie nos diversos veículos de comunicação.

Na internet o termo designado para divulgar este tipo de truque barato para jogar lixo cultural nas pessoas é denominado de SPAM.

Este termo SPAM tem origem na cena de um programa de série inglesa de comédia Monty Pyton, onde alguns Vikings desajeitados, num bar, pediram repetida e exageradamente o termo SPAM, uma marca de um presunto enlatado americano.

Vale uma digressão para um alerta. Embora usemos a palavra SPAM para a Internet, deveríamos combater a maioria do lixo cultural que recebemos, até mesmo de pessoas “preocupadas com o nosso bem estar”.

Do ponto de vista da internet, este envio abusivo de correio eletrônico não solicitado em grande quantidade distribuindo propaganda, correntes e esquemas de “ganhe dinheiro fácil”. É o envio de correio tentando forçar a leitura pela pessoa que recebe, que outrora sequer optou por este recebimento. Um desperdício de recursos da rede pago por quem recebe. Observando de modo restrito, que mal faz enviar algumas centenas de correios em mala-direta para outras? De modo mais amplo, quanto não se gasta levando em consideração o absurdo volume anual de correio eletrônico enviado?

Na TV parece moralista demais e até ridículo para pessoas cultas, mas uma solução para quem não pode pagar as TVs a cabo e fazer como sugere um comercial e jogar a TV pela janela, no comercial ironicamente, alguém diz ao TV – suicida: “pense nas crianças”, pois deve ser acrescido, “é pensando nelas mesmo”.

Na Internet SPAM significa enviar uma mensagem qualquer para qualquer quantidade de usuários, sem primeiro obter a expressa e explícita autorização daqueles destinatários. Esta relação além de abusiva, é desrespeitosa porque é impessoal, e as vezes manifestamos “sentimentos nobres”, mas feito para um número indiscriminado de pessoas, é claro, que o bom observador percebe que não há nada de pessoal na mensagem enviada.

Há outros enlatados, a festa das bruxas (típica nos EUA, mas que nada tem a ver com nossa cultura) é um exemplo disto, sem falar da insistência nas guerras urbanas, nacionais, religiosas e até intergalácticas. O que tem a ver com a cultura de nosso povo? A única reação inconsciente, alertava o filósofo Adorno, é o fato que estamos cada vez mais desconfiados de tudo (sem falar na paranóia que atinge os norte-americanos neste momento) e perdemos a singeleza dos contatos mais simples, de humanidade e humanismo, fonte de um verdadeiro solidarismo e fraternidade.

O filósofo Adorno lembrou em seu livro “Mínima Moralia”: “As pessoas estão desaprendendo a dar presentes. Na violação do princípio da troca (deve ser acrescido que os e-mails e celulares poderiam servir para isto), há algo absurdo e implausível; muitas vezes, até mesmo as crianças examinam com desconfiança quem dá algo, como se o presente fosse apenas um truque para vender-lhes uma escova ou um sabonete … Dentro dessa empresa tão organizada já não há mais lugar para a emoção humana, a doação está vinculada à humilhação pelo ato de repartir, de avaliar exatamente, em suma, pelo fato de tratar com um objeto aquele que é presenteado” (Theodor W. Adorno – Mínima moralia – reflexões a partir da vida danificada, Editora Ática, 1993).

Este procedimento, propiciado pelo baixo custo de envio de mensagem eletrônica, causa inconveniência e custo para o destinatário. O spammer (o autor do spam) só está olhando para os seus interesses egoístas e imediatos. Ele é capaz de passar por cima de qualquer regra mínima de convivência. Às mensagens enviadas pelo spammer nos referimos como “Mensagens Não Solicitadas”. Este não é o termo próprio, pois é um contra-senso admitir-se que alguém precisa de uma autorização especial para nos enviar uma correspondência. Na verdade, o que se quer é ter mecanismos que reduzam a níveis mínimos o volume de junk e-mails (mensagens “lixo”) em nossas caixas postais eletrônicas. Neste momento a ética deve ser chamada. Uma ética construída a partir do próprio berço.

Deve ser consignado que uma das iniciativas recentes para combater o SPAM foi uma reunião convocada por um dos Institutos mais importantes de pesquisa em computação, o MIT (Massachusetts Institute of Technology). Para surpresa geral, tem até agora mais de 500 inscritos, sendo que a expectativa girava em torno de 20 pessoas. Um dos organizadores, o cientista William S. Yearzunis, comparou o spam a pequenos crimes de rua que são altamente lucrativos porque ninguém os combate e são impunes.

Num momento em que parece-nos mais próximos de uma nova guerra absurda, deveríamos questionar também o lixo cultural de novas TVs, rádios, como aquela música (na verdade é uma nova versão de outras iguais) que sugere a intimidade com animais. Ignorar isto, é uma grave omissão, e colheremos as conseqüências. Este lixo está a nossa frente e boa parte dos nossas crianças e jovens estão consumindo isto e levando a sério coisas que jamais deveriam levar.

Ou repensamos nosso lixo cultural, pelo qual estamos sendo atingidos, e agimos já, ou colheremos o fruto cultural de nossa omissão.