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DOM CANDIDO PADIN, OSB- O BISPO DOS LEIGOS (1915-2008)

02 mar 2008

Maria Luiza Marcilio
( jornal Linha de Frente, ano I, n. 2. março 2008)

A partir do século III iniciou-se um milenar processo de uma eclesiologia que foi separando claramente o clero dos leigos, unidos até então, nas comunidades cristãs dos dois primeiros séculos. Pouco a pouco, foi se afirmando uma conotação depreciativa para o laicato como sendo entes “carnais’, em oposição aos considerados verdadeiros “espirituais”, os monges e o clero. Esse movimento culmina no século XIX, quando a  Cúria romana elimina de vez o pessoal leigo das decisões, se clericaliza inteiramente, reduzindo, finalmente, o leigo a membros passivos da comunidade eclesial, pelo Código de Direito Canônico, de 1917. Com grande coragem e descortino o Papa Pio XI criava, nos anos de 1920, o movimento da Ação Católica, que se tornou a grande escola de formação teórica e prática de leigos. Deveriam ser estes os agentes da evangelização e da cristianização de toda a sociedade. A partir do Concilio Vaticano II operou-se o grande despertar da Igreja para uma mais ampla e conveniente atuação do laicato no cumprimento da missão que Jesus Cristo lhe fixou: anunciar o Evangelho a todos os povos, de modo a transformar a convivência de homens e mulheres em toda a terra na promoção do Reino de Deus, um reino de justiça e de paz. Seria a transformação da figura dos fieis leigos em militantes ativos e responsáveis, juntamente com seus bispos, na implantação do Reino de Deus neste mundo.

Tendo estudado na Faculdade de Direito da USP e na Faculdade de São Bento, Dom Candido Padin foi um dos fundadores da JUC(1937), criada em São Paulo por Dom José Gaspar. Tendo como primeiro Assistente Eclesiástico da JUC o Prior do Mosteiro de São Bento, Dom Paulo Pedrosa, as reuniões dos primeiros dirigentes jucistas foram no Mosteiro, depois da Missa das 8hs do domingo. Esses dirigentes deveriam formar novos grupos nas suas Faculdades, transmitindo-lhes as mesmas reflexões que iam recebendo na Ação Católica. Foi ai, na militância da Ação Católica, que Dom Candido aprendeu a valorizar a força e a criatividade do leigo, desde que não subjugado ou oprimido pela hierarquia.

Como monge de São Bento, Dom Candido foi Reitor do Colégio e da Faculdade de São Bento. Foi chamado à vice-presidência e à presidência da AEC(Associação de Educação Católica- 1960). Aprendeu na vida prática a importância da educação como força transformadora de uma sociedade. Na encarniçada discussão pública que se seguiu à apresentação do primeiro Projeto de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Dom Candido assumiu o papel de defensor do direito dos alunos das escolas públicas de terem ensino religioso e da liberdade das escolas católicas particulares de continuarem a oferecer ensino de base para a sociedade. Nomeado membro do Conselho Nacional de Educação, nele permaneceu até o Golpe Militar de 64, quando se tornou suspeito, por ser um participante e defensor da JUC. Foi nomeado Bispo auxiliar da Arquidiocese do Rio de Janeiro de Dom Jaime Câmara e nessa qualidade participou ativamente do Concilio Vaticano II.

Nos anos de chumbo da ditadura, Dom Candido  lutou de frente e por escrito contra a Lei de Segurança Nacional.

Foi Bispo de Lorena (1966-1970) e  de Bauru (1970-1990) onde privilegiou o trabalho junto às comunidades das periferias, as mais pobres.

Membro da CNBB e do CELAM, particularmente na Conferência Latino Americana de Medellín, Dom Candido elegeu alguns setores para sua atuação mais direta e continuada: Direitos Humanos, Juventude, Educação e Laicato.  Como raros dentro da hierarquia, Dom Candido reivindicou sempre uma presença mais forte e digna do laicato junto às decisões eclesiais. Os leigos não deveriam continuar como meros receptadores de diretrizes do alto, mas terem espaço para serem co-participes da ação eclesial. Só assim, teriam condições de desabrocharem como forças vivas e renovadoras.

Dom Candido foi um defensor dos Direitos Humanos. Propôs que a CNBB assumisse um programa de formação em Direitos Humanos. Fiel ao pensamento de Jacques Maritain, um dos redatores da Declaração Universal dos Direitos Humanos, Dom Candido buscou promover, particularmente pela educação, o conhecimento e o respeito aos Direitos Universais do Homem.

Com 75 anos e apos 28 anos de vida episcopal, Dom Candido decidiu voltar ao Mosteiro. Recolheu-se à disciplina monástica, à vida de contemplação. Mas nem ai deixou de agir em favor dos leigos, da justiça e da Paz. Com seu colega de Faculdade Franco Montoro e com muitos de nos, fundou o Instituto Jacques Maritain (1992) para difundir a reflexão sobre o humanismo integral do grande filosofo católico francês.

No dia 25  de janeiro ultimo, rezando o Oficio da manhã, Dom Candido “adormeceu no Senhor”.

Sua obra permanece entre os monges seus seguidores e entre os leigos da Igreja Católica que seguirão seu exemplo, lutando pela presença do laicato na evangelização da sociedade, sempre e cada vez mais na busca da transformação do mundo.

 

Maria Luiza Marcilio – Presidente do Instituto Jacques Maritain